quinta-feira, 21 de julho de 2011

Transplantador transplantado


“Converter-me em paciente me ensinou muito desta vida

Tradução livre e comentários sobre artigo publicado no Jornal espanhol El Comercio no dia 17.07.11 - 02:36 - OVIEDO.


http://www.elcomercio.es/v/20110717/asturias/convertirme-paciente-enseno-mucho-20110717.html



Grupo Hércules SC





Foi transplantado em Santander em 27 de Janeiro e já leva vida normal. “Posso subir cinco andares sem cansar-me. Isso eu não podia fazer nem quando estava sadio!
Jesús Otero – Coordenador de Transplantes. Fazem 6 meses que recebeu um novo pulmão.
Fico contente que meu doador tenha sido um estrangeiro. Era de Lisboa e em sua homenagem vou aprender Português

O sistema de transplantes deve dar um passo a mais.Existem coisas do paciente que não percebemos

Depois de quase três décadas como Coordenador Regional de Transplantes, gerenciando notificações e buscando doadores de órgãos e tecidos onde fosse, no último 27 de janeiro, Jesús Otero passou de transplantador a transplantado. Neste dia, Chus, como é conhecido em toda a área médica, teve que deixar de lado seu jaleco, também seu inseparável blackberry e dar-se uma folga da Sala de Cirurgia. No Hospital de Valdecilla, em Santander, esperava por ele um pulmão que o permitiria burlar a fibrose pulmonar, ela o obrigou a usar oxigênio os seis últimos meses. Superado o transplante, se sente bem, agradecido, feliz e emocionado. Está um pouco magro, “mas estou vivo, o que não é pouco. Posso subir cinco pisos sem cansar-me. Isso não eu não podia fazer, nem quando estava sadio!”, afirma. Já reincorporado ao trabalho no sexto andar do Hospital Universitário Central de Astúrias (HUCA), sorri ao relatar sua experiência, mas confessa que não foi um caminho de rosas. "Foi duro".


Jesús Otero, já transplantado, passeia
pelas ruas
 de Oviedo.:: J. DÍAZ - 
-Que tal seu novo pulmão?
-Ufa, genial. Estou vivo, o que não é pouco! E tudo graças a um doador anônimo. Bem, na realidade sei que era um jovem português, de Lisboa. Sinto-me muito feliz que tenha sido um estrangeiro, porque isso demonstra que o sistema de transplantes funciona, não só na Espanha como também na Europa. Graças a esse gesto, a esse “sim” da família, posso agora estar aqui... (Sua voz falha ao recordar).

-Foi uma experiência forte?
-A mais forte de toda minha vida.

-Como começou tudo?
-Eu carregava já há tempos uma artrite reumatóide, que degenerou numa fibrose pulmonar. No ano passado vimos que havia ido além. Aí me disseram que iriam ter que trocar o pulmão, porque a fibrose pulmonar é uma enfermidade que acaba em morte se não te transplantam.

-Quando foi isto?
-Janeiro de 2010.

-Mas a operação só foi feita em 27 de janeiro de 2011...
-Sim, quis preparar-me todo o tempo possível. Não sei por que, mas queria entrar em lista de espera com todos os parâmetros muito claros. É verdade que foi um ano complicado, os últimos seis meses tive que usar oxigênio domiciliar  porque os meus pulmões estavam muito comprometidos – mostra a bomba de oxigênio que há detrás da mesa do seu escritório do HUCA. Quando já não pude mais entrei em lista de espera oficial, como não podia ser de outra maneira. A operação foi em 27 de janeiro em Valdecilla, centro de referência para este tipo de operação no Norte.

-Que pensou quando lhe chamaram dizendo que já havia um pulmão?
-Recordo que estava em casa. Eram dez e meia da noite e ia para a cama. De repente tocou o telefone e ouvi a voz de Carmencita, a enfermeira Carmen García da Unidade de Transplantes de Valdecilla... A primeira coisa que pensei foi: Puxa, que preguiça...! Mas em seguida reagi, “coloquei as pilhas” e disse para mim mesmo: 'mas Otero, tua vida em risco e  você pensando em dormir'
Saímos de imediato para Santander.


“Deixei o jaleco em Oviedo”

-Como foi isso de estar do outro lado do quarto, quando lhe perguntaram como está?
-Aceitei bastante bem, ainda que, se não fosse por Lola, minha esposa, que esteve ao pé da da bomba de oxigênio, talvez não tivesse aguentado (escreva isto, por favor, quero que todo mundo saiba).

-Passou de transplantador a transplantado...
-Isto é o mais interessante de tudo. Desde o princípio decidi deixar o jaleco em Oviedo. Tentei passar despercebido e fazer o  que me diziam.

-Esta experiência te mudou?
-Muda muitíssimo. Agora tenho outra visão da vida.

-E qual é?
-O presente requer muito mais importância. É um desperdício preocupar-se com coisas futuras e perder o dia a dia. Sempre soube que o Sistema de Transplantes funcionava, de fato eu  era e sou parte dele, mas dei-me conta do bem que funciona graças à humanidade e profissionalismo de muita gente. Estou agradecido a todo mundo.

-Que aprendeu sendo paciente?
-Converter-me em paciente me ensinou muito desta vida. Dei-me conta de que o Sistema de Transplantes, que alcançou níveis excepcionais, tem que dar um passo a mais. Não deve manter-se apenas em dar a vida, que (puxa) é muito. Mas tem que fazer mais.

-Por exemplo?
-Coisas relacionadas com o paciente que não percebemos. Por exemplo, a intoxicação por ciclosporina, que é um medicamento que se usa para evitar a rejeição ao transplante, Precisa de mais atenção. Aqui no HUCA iniciamos uma investigação sobre isso.

-Ou seja, trouxe deveres de Santander.
-(risadas). Algo assim. Mas é que sendo paciente vi que há algumas coisas que se pode melhorar.

-É duro esperar?
-Já sabes que dizem que a espera, desespera. Sim, é duro.

-Algum conselho para alguém que agora está em lista de espera?
-Que aguente. Que vale a pena e que em noventa e tanto por cento dos casos dá certo. Nas Astúrias,  2% da população vive graças a um transplante de órgão.

-Já tem vida normal?
-Completamente. Posso subir cinco pisos sem cansar-me, esta capacidade não tinha quando estava sadio!

-Dizia que gostava que seu doador tivesse sido um português.
-Na realidade gosto que tenha sido um estrangeiro, porque demonstra que os estrangeiros também doam. Além do mais, a possibilidade de se ter efetivado isto, é porque a Espanha, através da Organização Nacional de Transplantes, em algum dia firmou um convênio para que isso seja possível.

-Irá a Lisboa para agradecê-lo?
-Sim, e vou aprender português também. Eu devo isto a ele.




-Bem, Superada esta etapa, que tem agora em mente?
-Muita coisas. O primeiro é fazer um centro de medicina regenerativa no HUCA, já que o banco de tecidos que temos está obsoleto.

-Como estamos de doações?
-Vamos bem. Estamos com 26 doações, que já é 20% a mais em relação ao primeiro semestre de 2010. Aliás, este ano já fizemos seis transplantes renais de doador vivo.

-Chegou ao limite de Asturias?
-Quase. A taxa de negativas é pequena e a margem de melhora é restrita.

-Dentro de um ano completa 65.Se aposentará?
-Tenho que o fazer, sou obrigado pela nova lei.

-Se pudesse seguiria trabalhando?
-Depois disto, eu gostaria mais que nunca seguir dando duro no trabalho. Creio que devo muitas coisas à sociedade e, além do mais, gosto muito do que faço.




Mais sobre o assunto nos endereços abaixo:
http://www.elcomercio.es/v/20110128/asturias/trasplantador-trasplantado-20110128.html
http://atp-pancreas.blogspot.com/2011/01/estoy-vivo-y-respiro.html

E sobre o Dr. Jésus Otero e a Dra. Dolores Escudero (Lola):
http://www.premiosprincipe.com/content/view/452/455/

Mais sobre Transplantes de Pulmão na Espanha:
http://transplantes-pulmonares.blogspot.com/
twitter/@sandraAcampos


Fotos: